quinta-feira, 17 de julho de 2008

Convite ao Estúpido

 

A casca de um estúpido é a mesma que reveste o grosseiro, o indelicado, o insultuoso, o intratável, o malcriado, o mal-educado, o ríspido, o rude, o tolo, o idiota, o imbecil e o parvo. Os estúpidos de casca grossa são tantos e tão influentes, atualmente, que formam uma associação internacional: o Clube dos Estúpidos.

Para entrar de sócio na congregação dos parvos, a fila de inscrição cada vez aumenta mais. “Indicado” para participar do quadro associativo do Clube dos Estúpidos, o escritor Rubem Fonseca publicou o convite no seu livro de crônicas O Romance morreu.
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José
O senhor provavelmente jamais ouviu falar de nossa associação, o Clube dos Estúpidos. Sou Secretário de Divulgação e Relações Públicas do clube.
O nosso lema é a frase do grande poeta alemão Friedrich Schiller: Contra a estupidez humana até os Deuses lutam em vão. A criação do Clube dos Estúpidos, no Brasil, segue os modelos dos clubes dos estúpidos de outros países. A estupidez tem como características principais a sofisticação e a ubiqüidade, além de ser, para o indivíduo, um forte fator motivacional. É infundada a acusação comumente feita aos estúpidos de serem privados de inteligência e discernimento. Os neurofisiologistas sabem muito pouco sobre o funcionamento da mente humana. Se inteligência é, como dizem, a capacidade de resolver situações problemáticas novas mediante reestruturação dos dados preceptivos, os ratos de laboratório não fazem outra coisa senão demonstrar tal aptidão. E essa disposição para compreender e adaptar-se facilmente é, na verdade, uma forma de conformismo. Nós, os estúpidos, não aceitamos as regras e valores convencionais impostos pela sociedade, por isso dizem que nos faltam sensatez e critério.
“A Teoria da Estupidez”, do alemão Hans Von Eitel, está certa quando afirma que estupidez não é a mesma coisa que falta de inteligência, e que, não obstante seja uma característica humana essencial, não se sabe o que a estupidez é, exatamente. Quando um ser humano nasce, Deus lhe concede, como suprema graça, a capacidade de ser estúpido. Aquele que exerce esse dom é sempre feliz.
As atividades do clube, assim como a identidade dos associados são mantidas em segredo. Os associados fazem o juramento solene de não revelar o nome dos outros membros, para não expô-los ao escárnio, à inveja e ao mau-olhado. Temos sede própria, mas mantemos o nosso endereço e o local de nossas reuniões em segredo. Assim como ocorria antigamente na maçonaria, quando poucos sabiam que o imperador d. Pedro I dela fazia parte, o Clube dos Estúpidos tem vários sócios importantes, destacadas figuras dos setores político, econômico, social, educacional, acadêmico e cultural do país, cuja filiação associativa é desconhecida do público.
São aceitos sócios de todo o estado do Brasil, desde que comprovem, com palavras e atos, possuir condições para ser admitidos. O clube se reúne uma vez por mês, quando são debatidas as maneiras de se alcançar a condição reconhecida como “estupidez plena”. Os candidatos, com exceções especiais, como no seu caso, para serem aceitos como sócios são submetidos a uma entrevista prévia, na qual devem relatar, devidamente confirmada por testemunha idônea, uma ação pessoal taxada de estúpida por terceiros. O atual presidente do Clube, professor de uma importante universidade paulista, entre outras estupidezes cometidas, passou um mês de férias no Rio, na praia de Ramos, pensando que estava em Copacabana, além de ter levado para fazer cocô na praça um cachorro e um gato, juntos numa única guia com duas coleiras, inventada por ele com objetivo de educar esses animais fazendo cessar a hostilidade existente entre eles, mas que, lamentavelmente, causou a morte do gato.
O seu nome, prezado José, foi indicado por um dos seus membros do nosso quadro associativo. O Comitê de Seleção, depois de analisar o seu curriculum vitae e constatar suas qualificações, pediu-me que lhe escrevesse dizendo da nossa honra em ter o amigo como membro do nosso Clube. Estamos aguardando sua visita.

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