domingo, 29 de junho de 2008

Dante Mendonça

No Brasil tem leis que pegam, outras que não pegam. A nova Lei Seca, que proíbe os motoristas de beber qualquer quantidade de bebida alcoólica, é uma lei que pode pegar. Pode pegar metade da população e botar na cadeia.
A radical Lei 11.705 deve provocar uma mudança de hábitos da população brasileira. Antes o cidadão podia ir ao boteco da esquina tomar dois copos de cerveja e voltar sozinho. Agora, é preciso voltar ao lado de um advogado. Com uma advogada, melhor.
Bons tempos aqueles, quando dizíamos que a melhor feijoada com caipirinha era aquela em que uma ambulância nos esperava no lado de fora do restaurante. Hoje, para não fazer a digestão com o delegado, uma ambulância é mais do que necessária.
Ou então o marido liga para a mulher:

— Querida, venha correndo pagar a fiança e me tirar da cadeia!

— O que aconteceu?
— Tomei uma batida de limão e uma batida da polícia!
O amigo do balcão sabe quanto de álcool é agora permitido beber antes de dirigir? Nada. Absolutamente nada! E sabe quanto tempo o álcool permanece no sangue após o consumo e depois de quanto tempo o motorista poderá dirigir? Segundo a médica Júlia Greve, do Departamento de Álcool e Drogas da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), “um copo de cerveja demora cerca de seis horas para ser eliminado pelo organismo. Uma dose de uísque demora bem mais tempo do que isso. O mais garantido é que o motorista possa dirigir depois de 24 horas. Se estiver de ressaca e com sintomas provocados pela grande quantidade de álcool consumida, o melhor é ficar em casa. Esse é o momento em que o álcool começa a ser tóxico e permanece no corpo por mais tempo”.

Tolerância zero até na sobremesa. Em Santa Felicidade, nem é bom chegar perto do “Sagu com vinho”. No Restaurante e Bar Palácio, esqueça o “Mineiro com botas”, que é flambado com conhaque. O álcool usado no preparo pode ser detectado. A quantidade é mínima, mas também será registrada pelo exame de bafômetro e de sangue. Quanto à higiene bucal, atente para os produtos que contêm álcool.
Com a nova Lei Seca vai nascer uma nova tendência de mercado: as “Baladas da Vizinhança”. Quem mora no Bacacheri vai se encontrar com a turma no Bar do Edmundo. Quem mora no Batel, não sai do Batel. Quem mora no Portão, o melhor boteco é o mais próximo do portão de casa. E os que quiserem se deslocar do Portão ao Bacacheri, que chamem os motoristas dos deputados que assinaram essa lei carente de bom senso. Curitiba, enfim, vai ganhar a linha de ônibus InterBares, que venho sugerindo faz tempo. Outra sugestão é para o cidadão preencher um protocolo, a ser entregue aos gerentes dos bares, restaurantes e clubes. Quem chega dirigindo o carro, ao sair paga a conta, a fiança e a multa. Sem maiores burocracias.
A lei vale para qualquer condutor e em qualquer lugar onde puder circular um veículo. Portanto, quem estiver planejando casar os filhos no concorrido Santa Mônica Clube de Campo (distante 25 quilômetros de Curitiba), que consulte antes um advogado. Todos os convidados podem terminar a noitada no xilindró, inclusive o padre, e os pais dos noivos podem ser acusados de co-responsabilidade, por incentivo e indução ao crime.
Olho por olho, dente por dente, copo por copo. Casamentos, aniversários, formaturas, comemorações de fim de ano, os legisladores estão nos obrigando a realizar todas as festividades com a deliciosa Gengibirra Cini. Assim, vamos exigir exemplos recíprocos: neste ano eleitoral, não pode ser servida uma mísera cerveja nos jantares políticos em Santa Felicidade.
Dirigir embriagado é uma estupidez. Quem está no volante não bebe. Ou bebe e chama um táxi. Álcool e direção não se misturam, assim como cachaça e limão. No entanto, exageraram na dose. Da mesma forma que um garçom mede uma dose de uísque, os parlamentares deviam ter medido melhor a lei. Embriagados pelos eflúvios de Brasília, como sempre, legislaram sem moderação. Parece que bebem!

Dante Mendonça [29/06/2008]O Estado do Paraná.

Nenhum comentário: